30 de out. de 2011

MEU IRMÃO ROBSON



            A expectativa antes de nascermos é muito grande entre as pessoas da nossa família. A comissão de recepção, os preparativos, a ansiedade e a grande torcida quanto ao sexo é notada a todo o momento.
          Quando mamãe ficou grávida pela última vez eu tinha lá meus dezessete anos e estava decidido a sair de casa, criar minha carreira solo, criar minha independência, ganhar minha liberdade e ser apresentado ao mundo.
        Levei minha proposta de liberdade aos meus pais e eles foram enfáticos em dizer que eu só poderia sair de casa se mamãe tivesse um filho do sexo masculino.
        Um grande ponto de interrogação estava instalado na minha vida e minha torcida pelo nascimento de uma criança do sexo masculino transformou-se até em promessa e citações em profundas orações antes de dormir.
         A grande transformação, o estado latente de liberdade, a ansiedade, a expectativa eram parceiros constantes em todos os segundos da minha existência e não havia em todo o planeta uma pessoa que mais torceu pelo seu nascimento, pois afinal você irmão significava minha liberdade, sair de casa, conhecer o mundo sozinho.
        Lembro-me perfeitamente quando eu chegava em casa após um longo dia de trabalho numa fábrica de móveis em Itaquera, passava a mão carinhosamente na barriga da mamãe e dizia: Pois é garotinho, não vá decepcionar-me, pois você é minha liberdade. Seja bem vindo, mas não se esqueça de um detalhe: seja homem!
      Os dias foram passando, passando e exatamente no dia que todos oram pelos mortos, no dia dois de novembro, você mais uma vez nos surpreendeu com sua presença... ”Eles foram e eu estou chegando, chegando para brilhar, chegando para somar e contribuir com este planeta e com meu irmão com sua tão sonhada “Liberdade”. Eis me aqui, cheguei!”
    A alegria foi enorme quando você nasceu todos ficaram felizes e enquanto mamãe desfazia sua mala para recepcioná-lo, eu fazia a minha para encarar o mundo, conhecer novos caminhos, novos horizontes e deixei-os, escutando um choro de despedida entre lágrimas.
    O caminho foi árduo e várias vezes pensei em voltar, mas não havia volta e minha vontade em crescer, estudar e seguir em frente era bem maior que qualquer arrependimento.
   Joguei-me no mundo e às vezes aparecia em casa para revê-los, notava seu crescimento, sua alegria em viver, sua amabilidade, seu sorriso espontâneo e o carinho que nossos pais tinham por você e confesso em alguns momentos sentia uma “invejinha” por tanto afeto, tanto carinho que papai e mamãe oferecia pra você. Mas você era você e eu era eu, oka ou okê? (rsrsrsr), afinal eu fui e você chegou.
   Foram vários os momentos de plena alegria desde seu nascimento e o primeiro foi quando você tinha lá seus três anos e eu cheguei em casa e notei que você estava dentro de uma camiseta do nosso querido São Paulo Futebol Clube. Ostentava dignamente nosso orgulho da família e andava de lá para cá com o peito erguido e dizendo ser são paulino de coração. Quanta emoção, irmão querido! Fez-me em disfarçadas lágrimas enxutas com a manga da camisa, virando o rosto para não ser notado.
  Algumas datas festivas aparecia em casa: Dia das mães, dia dos pais e no final do ano, Revelion eram certas e jamais deixei de ir dar um abraço nos velhos nestas datas.
  Eu era tão bem recebido por todos, especialmente por você que me enchia de perguntas sobre o eu fazia, onde eu estava o que queria ser, etc., etc.
  O grande tapete da vida estava aberto e vivíamos uma época de plena alegria, esporadicamente eu os via e em alguns momentos recebia sua nobre visita na minha casa em São José dos Campos acompanhado dos nossos queridos pais. Foi numa destas visitas que os convidei para visitarmos um Parque chamado Santos Dumont e brincando acabei jogando você num grande lago e papai e mamãe demonstraram grande contrariedade ao ocorrido. Não havia dúvida, você era amado, muito amado por papai e mamãe!
  Outros grandes encontros aconteceram entre nós, mas aí você já era adolescente e como naquela época eu andava vendendo quase tudo que aparecia na minha frente convidei você para vendermos algumas cartelas de rifa e aconselhei-o a ser vendedor, mas ser um excelente vendedor e entrar para trabalhar numa grande empresa e você aceitou meu conselho e hoje eu orgulho-me em tê-lo como irmão e ser um dos melhores vendedores deste país.
   Parabéns irmão! Tenha certeza que eu simplesmente te amo de verdade e obrigado pela minha liberdade. Chuí! (rsrsrsrsr)

29 de out. de 2011

LAVAR ROUPA NA MINA

     Bacia na cabeça, alguns baldes, muitas roupas sujas e lá íamos nós descendo a ladeira rumo a nossa Felicidade chamada: Lavar roupa na mina.
      Não faz muito tempo não, apenas 41 anos atrás, 1970 foi a época que morávamos na Cidade A.E. Carvalho, bairro da periferia de São Paulo. Eu tinha 15 anos e adorava acompanhar mamãe até a mina, pois mesmo tendo que carregar os baldes cheios de roupas não me importava, pois sabia que sempre todos nós estaríamos muito feliz ao lado de mamãe e de minhas queridas irmãzinhas.
     Naquela época, eu tinha uma namoradinha que também nos acompanhava e prontamente oferecia ajuda e eu ficava “morrendo de vergonha”... mas chegávamos na mina, as  roupas eram despejadas na grama e nós saíamos para brincar ao redor de um pequeno lago, sempre orientados por mamãe para não nos afastarmos muito da sua vista.
     Muitas mulheres  iam lavar roupas na mina e às vezes eu ficava surpreso com a quantidade de pessoas, penso agora que até deveria haver um rodízio e que aquela “lavação” era mais um encontro social do que uma necessidade, pois falavam incessantemente das vicissitudes do cotidiano com muita naturalidade, ouvia-se muitas risadas e roupas sendo “socadas” numa enorme pedra ao lado da mina.
    Nós adolescentes corríamos ao redor da mina, brincávamos de quase tudo e quando éramos chamados por mamãe já era hora de regressar para nosso lar.
    Nós adorávamos quando mamãe colocava as roupas para quarar e depois passava na água, pois assim era possível ficarmos mais alguns minutos na tão adorável mina.
   Não existia um dia fixo para irmos à mina, era necessário fazer Sol e ter muita roupa suja para a nossa alegria fazer-se presente.
   Muitas vezes eu levava algum livro para ler, indicado pela escola e não conseguia ler mais que três páginas, pois não encontrava concentração no meio de tanta conversa, risos, mães “ralhando” com os filhos por estarem fazendo alguma peraltice ou sendo incomodado pela namorada querendo algum beijinho escondido da multidão.
    Quantas alegrias vivemos naquela época! Foram várias entre um tempo difícil, era água de poço, mas existia a mina que era nossa maior alegria!

27 de out. de 2011

SINTONIA DO AMOR



        Toda a alegria do viver parece que se resume em apenas um dia chamado sexta-feira. A semana arrasta-se até quinta-feira, é um sofrimento “danado” para acordar e sintonizar-se com o mundo...mas na sexta-feira tudo é diferente, muito diferente.  Talvez pela proximidade do final de semana, aquele happy-hour mais demorado, de poder acordar um pouco mais tarde no sábado, comer um delicioso pastel da feira, enfim é na sexta-feira que tudo acontece e foi exatamente numa sexta-feira que começou um lindo caso de amor.
     Trabalhava numa indústria em Guarulhos e dificilmente chamavam a gente para atender telefonemas, mas naquele dia chamaram-me e minha sobrinha Samantha pediu-me se podia hospedar alguns amigos artistas e ela na minha casa e prontamente disse que sim, só pedi a ela que fosse após as 23hs, porque era o horário que chegava em casa.
      Cheguei em casa cansadíssimo e fiquei aguardando o pessoal e não demorou muito aparecer, fomos apresentados, entramos, os novos amigos encostaram os seus preciosos instrumentos musicais num velho guarda-roupa e esticaram-se pelos únicos dois cômodos existentes.
     Ofereci minha cama para minha sobrinha Samantha e joguei meu corpo sobre algumas cobertas, na cozinha, ao lado de um músico chamado Matheus.  Algumas conversas esparsas, alguns sorrisos e meus olhos começaram a fechar e a boca da minha sobrinha e do novo amigo Matheus não paravam de falar. Falavam de tudo, riam e pareciam muito felizes, até que num determinado momento perguntei a minha sobrinha:
- Samantha, você disse para sua mãe que viria dormir aqui em casa?
- Ah sim tio, disse sim!
- Então...Dorme pelo Amor de Deus!
      Simulavam um curto silêncio e voltavam a falar novamente, risos abafados, vozes roucas...e amanheceu sem eu ter fechado o olho por um segundo. Não sabia se estava feliz ou muito irritado.
     Levantei-me às 6hs e convidei o Matheus para irmos comprar pão numa padaria próximo de casa. Compramos quatro pães, alguns pães de queijo e uma caixa de cerveja,  mortadela e queijo.
     Chegamos em casa e o pessoal ainda estava dormindo, preparei alguns pães com queijo e abri e primeira lata de cerveja e começamos a conversar sobre os mais variados assuntos e senti que o rapaz era uma ótima pessoa e imediatamente pensei: “Será que eles já são namorados?” Após bebermos toda a caixa de cerveja retornamos ao mercadinho do Português e solicitamos mais uma caixa de cerveja e continuamos a beber e a conversar e então o Matheus pegou seu Violoncelo e dedicou uma linda música para minha pessoa. Todos  acordaram ao mavioso som do instrumento, desejaram um bom dia e a Samantha pediu se eu aceitava acompanhá-los até a Praça Benedito Calixto, em Pinheiros. Disse que sim, e saímos alegremente até a rua onde tive a felicidade de ouvir mais algumas músicas dos novos amigos artistas embaixo de uma árvore, acordando toda vizinhança, estupefata com um som muito diferente de tudo aquilo que eles ouviam.
     Seguimos até uma agência bancária, saquei alguns trocados e pegamos o Vila Madalena, sentido Pinheiros. Tudo era muito lindo, estava um pouco anestesiado pela bebida e pelo encontro com pessoas tão maravilhosas. O Sol fazia-se presente e o sábado era um desses sábados resplandecentes inexistentes em qualquer parte do planeta.
     Descemos num maravilhoso cortiço em plena Henrique Shauman, pegaram um banquinho e fomos para Praça Benedito Calixto acompanhados de todos os instrumentos e mais um músico que tocava violino.
   Armaram todo o espetáculo em plena praça e começaram a apresentação e repentinamente o povo começou a chegar e eu pedi que eles tocassem “O trenzinho Caipira”. A apresentação foi um êxito, retornamos e quando entramos no cortiço fiquei encantado.  O pessoal morava num quarto com acabamento rústico, uma pequena valeta na porta, um cabide sustentava alguns ternos do grupo e alguns ratos visitantes eram presentes.
     Ficamos eternos minutos conversando sobre tudo, a noite aproximava-se e senti muita vontade de ingerir uma bebida forte, muito forte e um pouco antes de sair sugeri a minha sobrinha um namoro com o Matheus e ela ainda questionou quanto à aceitabilidade....Sentia que entre os dois já existia um encanto maravilhoso e era questão de aproximá-los....Voltei e encontrei os dois sorrindo. Convidaram-nos para dormir no castelo e aceitamos.
     Eu estava com uma dor muito grande de cabeça observando a mais nova Sintonia do Amor: Samantha e Matheus. Parabéns lindos! Eu os amo de Coração! Assim aconteceu, quem esteve presente? Nós, é claro! Elenco: Samantha, Matheus,Caio,Luiz, Os ratos, Vila Medeiros, Praça Benedito Calixto, sexta-feira, sábado, Sol, Felicidade, alegria...alegria em poder fazer parte desta história! Obrigado queridos!

17 de out. de 2011

FELIZ ANO NOVO!


         No último dia do ano a Felicidade chegava às primeiras horas da manhã em nossa casa.
         Abria os olhos e admirava os primeiros raios de Sol entrando pelas frestas da velha janela, iluminando nossas esperanças e espalhando alegria por toda a casa.
         O delicioso aroma de café espalhado no ar invadia nosso olfato e impulsionava-me a levantar da cama para degustá-lo com deliciosas rabanadas preparadas com muito esmero por mamãe.
         Ao sentar-me a mesa para tomar o café notava que todos estavam muito feliz e bastante falante, sempre tentando descobrir quem era o Amigo Secreto.
          Entre sorrisos marotos e olhares desconfiados, às vezes conseguíamos descobrir quem era nosso Amigo Secreto, depois de várias perguntas e algumas tentativas de engodos.
          Uma lona amarela era esticada no quintal para cobrir a enorme mesa de madeira que receberia as guloseimas preparadas por mamãe e nas primeiras horas do Ano Novo transformar-se-ia num grande cassino familiar.
          Os primeiros fogos de artifício eram ouvidos ao longe, a tarde chegava trazendo amáveis visitas que se acomodavam num sofá e começavam a contar várias piadas que se misturavam com risos altos e o barulho de batedeira da cozinha preparando um bolo.
           Um banho mais demorado, uma roupa branca e estávamos preparados para receber o Ano Novo. A corrida de São Silvestre acontecia às 23 horas e era acompanhada com muito entusiasmo por todos.
           Faltando alguns minutos para meia-noite, mamãe posicionava num ponto estratégico ao redor mesa, convocava todos nós e iniciava uma prece chamada “Cáritas”, rezávamos o Pai-Nosso agradecendo a nossa existência e pedindo proteção para o novo Ano.
           O silêncio entre nós só era “quebrado” por vários estampidos de fogos que aumentavam, prenunciando a chegada do Ano Novo.
           Um champanhe era aberto: palmas, abraços e beijos  eram distribuídos e não era raro ver alguém chorar de tanta emoção.
            Os presentes de Amigo Secreto eram distribuídos sob uma grande e organizada algazarra e às vezes gravávamos em fita cassete toda a nossa felicidade para ouvirmos posteriormente.
           Estávamos num novo dia, num Novo Ano, a música da radiola era aumentada, as cartas de baralho eram colocadas sobre a mesa, o barulho dos fogos era ensurdecedor. Feliz Ano Novo!
           Papai e mamãe conseguiam reunir toda nossa família para saudar o Ano Novo. Feliz, muito Feliz aqueles tempos! Feliz Ano Novo!

3 de out. de 2011

DATILOGRAFIA



         Hoje olhando para o teclado do computador  fico maravilhado com as mudanças ocorridas nos últimos... ”me deixa eu pensar” trinta anos, é exatamente por ai.   Lá pela década de 70  lembro-me que quando completávamos  treze  anos  nossos  pais  começavam a procurar uma escola de datilografia, que geralmente localizava-se nos bairros em que morávamos. Naquela época todos os bairros tinham uma escolinha de datilografia, onde recebiam os alunos carinhosamente para o aprendizado que eles levariam para uma vida inteira.
Comigo não foi diferente, logo aos treze anos minha mãe conseguiu matricular-me numa escola de datilografia que ficava no bairro onde morávamos. Era uma escola muito singela, com umas três máquinas Remington em cima de algumas mesinhas carcomidas pelo tempo, algumas folhas de papel sulfite e um professor magrelo com umas folhas amareladas que rapidamente colocou-as ao lado da máquina e passou a dar-me as primeiras instruções: colocar a folha na máquina, fazer as primeiras tabulações e orientar-me quando as duras teclas que deveriam ser apertadas seqüencialmente imprimindo a mesma força para todos os dedos.
Meio atrapalhado e sempre observando a habilidade do professor magrelo, ficava imaginando onde alguém poderia aproveitar um datilógrafo medíocre como eu.
Mas eu não esmorecia e todo o dia lá estava eu, suando em bicas  a apertar as duras teclas da velha máquina de escrever Remington, até que num determinado dia disseram que eu já estava preparado para ser um datilógrafo. Ri muito e não acreditei,  cheguei com meu diplominha e coloquei na gaveta do guarda-roupa e fiquei pacientemente aguardando uma oportunidade de mostrar toda a minha habilidade de datilógrafo que tinha aprendido com o professor “caveirinha”.
   Não demorou muito e comecei a trabalhar numa Cia. De seguros e aí toda a minha habilidade fora demonstrada com grande habilidade e muitas folhas caídas pelo chão, até tornar-me um exímio datilógrafo e desafiar algumas empresas em querer trabalhar por produção.
   Mas isto aconteceu faz muito tempo e muitos jovens de hoje jamais têm a noção o que é uma máquina de escrever e não sabem nem de longe o que é ser datilógrafo e ter que agüentar o professor nas quentes tardes de verão, sem ventilador... Ufa, como adoro nossos dias.....mas sinto saudades  da antiga e amiga máquina de escrever  Remington, que virou peça de museu, assim como eu estou virando! rsrsrsrsr