23 de jun. de 2011

BUCHA FRITA


BUCHA FRITA

Lá pelo final do ano de 2.002, morava num “cortiço” em Guarulhos, mas era um cortiço muito elegante, bem organizadinho. Acabei caindo por lá sem querer. Trabalhava num Instituto de pesquisa, como pesquisador e morava na casa da minha tia Terezinha e quando cheguei na casa desta minha tia ela foi bem enfática em dizer: Após Hum ano de residência por aqui você tem que cair fora, arrumar outro lugar. Passados os doze meses ela disse-me: E aí querido sobrinho já arrumou um novo lar? Este que você está venceu o contratado...Um abraço! Entrei em desespero e o primeiro buraco habitável que encontrei e entrei.  Uma chuva fininha acompanhava-me numa caminhonete do vizinho que além de alguns bons livros, um colchão velho e uma mesinha para escrever pífias crônicas jamais lidas por ninguém. Deixou-me na porta do cortiço, desejou-me boa sorte e saiu em disparada. Sentei-me no colchão, embaixo daquela chuva fininha e não sabia se chorava ou lia alguns dos livros de Dostoievski, tipo Humilhados e ofendidos ou memórias do subsolo, qualquer dos dois seriam ótimos diante da situação daquele momento. Optei em resignar-me, abaixar a cabeça e descer as escadas com aquele colchão velho e uma caixa cheia de livros, alguns já lidos outros ainda dentro do envelope. Apreensão e estado total de alerta fazia-me sentir-me um cão acuado dentro de um cubículo de quatro metros quadrados. Armei a cama, a pequena mesinha, dispus os livros sobre ela e saí para comprar um lanche e beber uma pinga para esquecer tanto sofrimento em tão pouco espaço de tempo. Cheguei e pensei estar noutro ambiente, pois o som saia de um dos quartos, era um Rap  sendo tocado enfatizando o estado social do povo brasileiro. Medo era pouco o que sentia naquele momento, até que escutei uma voz familiar, enchi-me de coragem etílica e saí para dar um grande abraço num primo que fazia anos que não o via. Sentí-me um pouco mais aliviado. Fui apresentado para outros rapazes e fui deitar com a alma mais leve.
     Tudo estava correndo absolutamente normal, levantava-me bem cedo, arrumava-me e ia comer no restaurante de Hum real, fazia algumas pesquisas e regressava para meu minúsculo quarto ao anoitecer e alcolizava-me diariamente.
     Passados alguns meses que estava morando no cortiço, telefonei para meu irmão Robson, morador na Vila Maria Alta e convidei-o para fazermos um peixe frito, regados a inúmeras cervejas, ele prontificou-se a levar as cervejas. Lembro-me perfeitamente que fui até um grande atacadista e comprei uma enorme tainha e deixei-a sob a pia e fiquei pacientemente esperando meu irmão chegar com as cervejas, não demorou muito ele apareceu com várias caixas de cervejas e pediu para colocarmos na geladeira, ir temperando o peixe que iria trabalhar e voltaria pra saborear o peixe e as cervejas. Fiquei esperando ele até às treze horas e nada de aparecer, então comecei a limpar o peixe e beber cervejas, eu e o primo Levi, lá pelas 3 da tarde já estávamos bêbados, pois tínhamos bebidos várias caipirinhas também e comecei a limpar o peixe. Papo vai e papo vem, limpei todo o peixe, lavei-o e coloquei os pedaços numa tigela, empanei e comecei a fritar. Meu primo Levi começou a reclamar de um cheiro muito forte de plástico queimado e eu dizia: Também com tantas indústrias aqui em Guarulhos poluindo nosso ar, tem mais é que cheirar plástico queimado mesmo! Fritei todos os pedaços de peixe e convidei outro colega chamado Arilson para participar da degustação da tainha. Cervejas eram bebidas e pedaços de peixe eram comidos, até que meu primo cutucou um pedaço de peixe, levantou-o, deu uma mordida e começou a rir alegremente. Perguntei a ele qual o motivo de tanta risada, ele simplesmente disse: Pô primo, já comi de quase tudo nesta vida, mas bucha frita é a primeira vez! Peguei o pedaço de bucha frita, analisei com aquele ar de entendido em polímeros de grande indústria química e disse: Pois é primo, desculpe-me, acabei empanando a buchinha de lavar louça junto com os pedaços de peixes e fritei-a..Mas ...Rimos largamente e abraçamo-nos pelo desequilíbrio etílico. Grande momento, inesquecível! Bucha frita! Horrível! Aca!