27 de abr. de 2012

ASSOBIO


        Estava eu sentado num banco de um enorme pátio durante o intervalo do café do meu serviço e observando alguns trabalhadores que se esforçavam em deixar a área limpa e escutava um mavioso assobio vindo da parte de trás do banco.
         Virei a cabeça para observar quem estava assobiando aquela linda canção e fiquei surpreso quando o trabalhador braçal interrompeu a canção para desejar-me um bom dia. Retribui o bom dia e fiquei a imaginar o porquê das pessoas não mais assobiarem.
         Lembro-me do meu pai quando estava barbeando-se assobiava lindas canções, do velho comerciante encaixotando frutas e assobiando e até eu também assobiava algumas músicas.
         Será que não mais assobiamos pelo motivo da poluição sonora romper nossos sentimentos? Ou perdemos a alegria diante do cotidiano?
         Um velho hábito que ainda sinto muita falta, ver as pessoas assobiarem alguma canção e expandirem a alma enquanto deixam-se carregar pelo tempo em busca do amanhã.
         Fiquei ali por algum instante observando e escutando o trabalhador assobiar aquela linda canção enquanto capinava os matos e mostrava um rosto de muita felicidade. Como sou muito observador e questionador fui perguntar ao trabalhador porque ele estava tão feliz e ele parou de assobiar, sorriu e disse-me que naquele dia tinha sido pai pela primeira vez e não aguentava de tanta felicidade. Não me contive, dei-lhe um enorme abraço e muitas felicitações e pedi a ele que jamais deixasse de ser feliz.
         Entrei para trabalhar com aquela canção do trabalhador na mente e inesperadamente comecei a assobiar a mesma canção sob os olhares apreensivos dos meus colegas de serviço.

AULAS DE MATEMÁTICA


     
        Aquele sábado amanheceu chuvoso, acordei e abri os olhos lentamente e fiquei imaginando o que faria na próxima semana.
         A chuva não cessava e o barulho que produzia sobre o velho telhado de amianto chegava a ser romântico se não fosse minha situação de desempregado.
         Sentei-me na cama, coloquei os pés no chão e fiz minhas orações matinais e resolvi tomar uma atitude que mudaria completamente a minha vida.
         Durante o café matinal comentei com minha irmã que iria dar algumas aulas de matemática e solicitei que me ajudasse a divulgar minha nova atividade, pois precisava ganhar alguns “trocados” e ela sugeriu que eu colocasse uma placa divulgando minha mais nova atividade em frente de casa e aguardasse os primeiros alunos.
         Fiz uma pequena placa com os dizeres: Aulas de Reforço de Matemática para o Ensino Fundamental – Professor Luiz e meu telefone e coloquei em frente da casa da minha irmã e fiquei aguardando os primeiros alunos.
         O final de semana foi de intensa chuva e ninguém apareceu solicitando aulas de matemática e eu continuei minhas leituras sentado confortavelmente numa velha poltrona carcomida pelo tempo e imaginando como seriam as aulas de matemática.
         Na segunda-feira quando eu estava preparando-me para ir para a biblioteca estudar um pouco, minha irmã chegou e anunciou que tinha um garoto que gostaria de conhecer-me, pois estava necessitando de algumas dicas de matemática para fazer uma prova muito difícil na escola particular onde ele estudava e pediu-me para ir até a casa do garoto.
         Quando cheguei o pai do garoto foi logo perguntando quanto eu cobrava por hora para fazer seu filho passar de ano e eu tinha pensado em tudo, menos no valor e disse a ele que iniciaríamos os estudos e depois que ele fosse aprovado a gente acertaria o valor.
         A assim começamos nossos estudos e solicitei ao garoto o que ele gostaria de aprender e ele disse-me:
- Necessito aprender equação do segundo grau e alguns gráficos, pois não entendo nada!
Pensei: “Este presente caiu do Céu”, pois o que eu mais sabia na minha vida era equação do segundo grau, pois muito tempo atrás tinha aprendido muito equação do segundo grau para conquistar uma garota.
         Todos os dias lá estava eu na casa do meu “aluninho” resolvendo equações do segundo grau e muitos exercícios foram resolvidos e estudamos durante toda a semana, pois o aluno faria a prova na Sexta-feira.
         Após o garoto ter feito a prova ele passou em casa e era perceptível o seu rosto de felicidade e disse-me que tinha ido muito bem na prova.
         No domingo de manhã o aluno apareceu em casa e disse que o seu pai queria falar comigo para “pagar” as aulas de matemática e lá fui eu receber qualquer quantia, pois na situação em que eu estava qualquer dinheiro que fosse suficiente para sobreviver seria bem-vindo.
         Cheguei à casa do meu aluno e vi toda a família reunida em volta de uma mesa repleta de comida e imediatamente o pai do aluno pediu para eu sentar e almoçar, pois ele estava muito feliz comigo e pediu para sua “patroa” preparar uma deliciosa bacalhoada para comemorar a vitória do seu filho.
         Apresentou-me a todos como o “Professor de Matemática” do seu filho e enquanto íamos almoçando ele pedia para eu colocar um preço no meu trabalho e eu disse a ele que necessitava de dinheiro suficiente para comprar algumas roupas e locomover a procura de um novo emprego.
         Sorriu, abriu o talão de cheque e começou a preencher uma folha, assinou e depositou em minhas mãos um cheque com um valor muito alto e disse: Este valor é suficiente? E eu disse a ele que aquele valor seria suficiente para eu passar uns três meses desempregado e ele sorriu e saímos abraçados até a porta.
         Sob a fina garoa, retirei o cheque do bolso da camisa e observei a quantia grafada e novamente agradeci minha querida colega de classe que fizera eu tanto estudar para conquistá-la. Não a conquistei, mas o retorno chegou muitos anos mais tarde em “Aulas de Matemática”.