2 de out. de 2011

GUERRA E PAZ

  Aqui se faz aqui se paga! Então minha dívida com o Divino já está paga. Como assim? Calma pessoal, explico-me. Existiram dois momentos em minha vida que merecem ser retratados ou talvez relembrados, sei lá, só sei que não poderia partir sem relatar as experiências vividas antes de prestar minha conta com o Pedrão.
   Lá pelos idos anos de 1.986 comecei a trabalhar numa indústria bélica e até tinha um cargo importante dentro da empresa, era Inspetor de qualidade na área eletrônica e todos os equipamentos antes de ir para o “front”  passava pelas nossas mãos e nossas mentes repletas de fórmulas, cálculos serviam para esparramar nossos conhecimentos em prol da perfeição, em não errar.
  Em 2.004, após passar por momentos dificílimos, consegui entrar para trabalhar numa indústria de remédios e aí comecei a refletir o quanto é maravilhoso produzir algo que irá aliviar a dor de alguém ao invés de causar o sofrimento de outros.
  Trabalhei em “salas limpas” em dois momentos: O momento da Guerra e no momento da Paz, quando inspecionava equipamentos delicadíssimos na indústria bélica, jamais  imaginava que anos posteriores iria usar todo o meu conhecimento para proporcionar o alívio de seres doentes e em alguns  momentos chegava a chorar em relembrar.
   Hoje, pensando profundamente nos momentos vividos,  é fácil decidir entre os dois...com certeza: A Paz, esta mesma Paz que tanto a humanidade clama e desejamos em todos os momentos.
 - Onde você trabalhou? Perguntará o Pedrão.
- Na indústria “xis”, fabricando equipamentos bélicos.
No rosto sério do Porteiro do Céu aparecerá algumas rugas de apreensão e girando o lápis entre os dedos dirá:
- Ok amigão, aguarde aí do lado que parece que você terá alguns anos de perdão!
- O medo dominará totalmente minha alma, até que serei chamado novamente e nova pergunta surgirá:
- Além deste trabalho, chegou a desenvolver outro que possa isentar você de ir para o Inferno?
- Sim,  claro, trabalhei numa indústria “Y” como operário, fabricando remédios para pessoas doentes, durante muito tempo!
- Qual foi sua última atividade na terra?
- Era Inspetor de Alunos!
- "Putz", senta aí do meu lado, pega esta lista e ajude-me a organizar esta fila enorme, depois a gente vai estudar seu caso...complicadíssimo!
   E assim ficaria por lá, aguardando o momento da definição, mas enquanto isto ía dando uma "espiadinha" nas apostilas dos concursos, afinal a gente nunca sabe o que pode acontecer! 

O CAFONA - OS BAILES DA VILA RÉ



       Em 1.970, eu era um adolescente de 15 anos de idade e estava vivendo o melhor  ano de toda a minha vida, isto eu ainda não sabia, digo isto agora...mas como todo garoto daquela época,  já trabalhava com carteira assinada numa Cia. De Seguros, tinha algumas paquerinhas e adorava passar as tardes de sábados no Centro Educacional da Mooca, na Piscina e quando chegava em casa começava a preparar-me para ir a um baile chamado “O Cafona”, que ficava na Vila Ré, Zona Leste de São Paulo.
     Assim que chegava em casa tomava um demorado banho de balde, perfumava-me com um desodorante barato e vestia uma calça boca de sino azul com listras brancas e cintura bem alta, uma camisa “Gola Olímpica”, que chamávamos carinhosamente de “Volta ao Mundo”, um sapato com saltos enormes, chamado salto carrapeta, um cinto com uma fivela imensa. Repartia meus cabelos compridos ao meio, emprestava algum dinheiro do meu pai e ia ao encontro dos amigos Israel e Luizão para encontramos nosso tesouro feminino nos bailes do Cafona.
    Assim que encontrava com meus amigos era zombado com vários assobios: “fiu, fiu!” enaltecendo meus trajes  e o agradável odor de perfume de quinta categoria e lá seguíamos nós em plena “louçania” dos nossos 15 anos, falando muito sobre o cotidiano, das lindas meninas que se déssemos sorte encontraríamos no baile, sorrisos altos e olhos observadores para tudo e para todos.
   Após uma caminhada de uns trinta minutos, chegávamos ao Cafona e ficávamos observando as lindas meninas chegarem com os cabelos estilo Chanel, com muito “laquê”, vestidos rodados e sorrisos alegres, algumas vinham acompanhadas dos pais, o que deixava-nos muito apreensivos, pois sabíamos que seria muito difícil abordá-las.
    Após alguns minutos naquele flerte, tomávamos coragem, passávamos a língua nos lábios e entrávamos sem muita purpurina. Às vezes éramos notados logo na entrada e ficava fácil bailarmos as três horas apenas com uma única menina. Mas isto acontecia muito raramente, pois na maioria das vezes éramos obrigados a garimpar nosso tesouro com muito esforço, mas sempre acabava por arranjar alguma pequena interessante.
   Os meus amigos  se davam muito bem, pois eles eram “galinhas”, hoje o pessoal fala “pegador”, bailavam com quase todas as meninas, sem restrição, agora eu..era um pouco tímido e meio “bobão”, pois não aceitava bailar com qualquer menina e sempre escolhia as mais bonitas, o que diminuía muito minhas chances de arranjar alguma menina. Quantas vezes  passava o baile todo observando os meus amigos bailando e eu bebendo guaraná e de olho numa “linda” e ela não dava a mínima chance de aproximação.
   Mas quando anunciam a última música, ficávamos desesperados para encontrar alguém, valia tudo, o importante era dançar a última música que se chamava Rock Roll Lo Lo Bye cantada por B.J.Thomas. Rostos colados e os olhares  de algumas mães colados na gente, nada de grave acontecia, a não serem alguns cochichos  inaudíveis prometendo vir no próximo baile e sempre enaltecendo a beleza que às vezes não condizia com a realidade, mas valia tudo, até dar alguns pisões nós pés das damas e ser largado em plena música. Que vergonha!
    Terminada a música, dávamos um enorme suspiro e saiamos com a alma repleta de felicidade, alguns beijinhos em algumas meninas sempre prometendo o retorno no próximo final de semana e pé na estrada porque se fazia tarde, afinal tínhamos que chegar em casa antes da meia-noite.
    Quantos bailes! Quantas alegrias vividas ao longo da nossa adolescência que hoje as trago bem no fundo do meu coração e faz-me sentir que vivemos nossa época intensamente, com a pureza e alegria dos jovens da geração 70. Que saudades!