30 de jul. de 2011

Histórias de Papai

                                                                                                                                                                                                                                                                              Enquanto papai não chegasse em casa não poderíamos jantar, às vezes ficava com muita raiva, devido à fome que invadia meu estômago, resignava-me num cantinho da mesa e ficava humildemente aguardando o retorno de papai e quando papai chegava em casa, levantávamos da mesa e corríamos dar um abraço e um beijo nele e pedíamos que se sentasse para jantar. Não, tínhamos que esperar papai tomar banho para iniciarmos nossa refeição. Aquele banho de papai parecia que demorava uma eternidade e meu estômago roncando, roncando. Papai sentava-se a mesa e mamãe servia-o, após servi-lo éramos servidos e começávamos a comer vagarosamente sempre observando a calma e o olhar de agradecimento de papai em tê-lo esperado para a janta.
                 Após a janta vinha a nossa recompensa, ficávamos algum tempo sentados num velho banco de madeira no quintal de casa ouvindo várias histórias maravilhosas contadas por papai. Jamais pedíamos para papai contar a mesma história e o repertório de histórias era vasto, mas a história que mais me impressionava era quando ele contava que por algum tempo tinha sido ajudante de carvoeiro no meio do mato. Seu relato, com voz pausada enfatizava as condições de precariedade existente naquela época e deixava-nos atônitos quanto a sua bravura em passar vários dias no meio do mato, entre bichos,  dormindo numa palhoça improvisada e colocando fogo em madeiras para virar carvão, ser ensacado e transportado para a cidade.
                 Sempre pedia detalhes sobre o que comiam, o que faziam enquanto as madeiras eram queimadas, como eles comportavam-se diante de noites chuvosas, temperaturas baixas, saudades da família. Imaginava-me no meio do mato ajudando meu avô, todo sujo de carvão  e correndo atrás de passarinhos, borboletas e a noite ouvindo o piar de corujas, pássaros estranhos e outros animais como onça, tatu, lagarto.
               Nas noites de lua cheia as histórias ficavam mais emocionantes, pois a descrição era ilustrada com algumas mulas sem cabeça, saci pererê, curupira entre outros da nossa lenda e folclore tanto comentados pelos nossos antepassados.
              Lá pelas nove horas da noite, era hora de entrar e recolhermos para nossas camas e controlarmos nossos medos e aflições, fechar os olhos e ficar torcendo para a noite passar logo e chegar outro dia a noite para escutarmos mais histórias fantásticas. Então papai apagava a luz do lampião, dava um beijo na face de cada um de nós e recolhia-se para o seu quarto. Sempre ouvia papai conversar algumas palavras com mamãe e depois tudo se fazia silêncio, ouvíamos apenas o som de grilos e sapos que habitavam ao redor da nossa casa.Era hora de sonhar...