18 de mar. de 2012

MALAS


            E então quando nascemos a alegria é imensa entre nossos pais, pois lá estamos nós com nossos chorinhos manhosos apreciando papai e mamãe desarrumando a mala para retirar as primeiras roupinhas e tentar colocar na gente, sempre meio atrapalhados pela emoção de apertar aqui ou ajustar acolá. Pronto já estamos banhados e prontos para irmos para os colos dos visitantes. A mala é abandonada num canto qualquer e todos os focos são voltados para nossa carinha linda.
            O tempo vai passando e mamãe resolve nos batizar em Aparecida do Norte e lá estamos nós novamente colocando a mala em cima da cama e delicadamente as roupinhas são colocadas e estamos prontos para partir.
             A vida segue e até entrarmos para o curso primário foram várias às vezes em que presenciei as malas serem feitas e desfeitas por mamãe quando papai ia viajar e confesso que em algumas vezes ficava com o coração aflito e alma pequenininha imaginando que talvez papai não voltasse mais e entre algumas lágrimas escutava o barulho do zíper fechar-se e eu corria para o quarto para não presenciar a partida que era muito doida. Mas sempre papai voltava e quando ele chegava eu fazia questão de arrastar a enorme mala pela casa e desfazê-la para ver se encontrava algum presentinho escondido lá no fundo, bem no fundo da mala e meus olhos brilhavam de alegria quando eu os encontrava e aí corria e dava um abraço bem apertado em papai e abandonava a mala totalmente aberta na sala sob os olhares repreensivos de mamãe.
         Nas Férias escolares mamãe anunciava que eu iria passar alguns dias na casa da minha avó Duvina e do avô João em Salesópolis, interior de São Paulo e novamente fazíamos as malas com muita alegria e partíamos para pegar o trem para Mogi das Cruzes e depois um ônibus que deixava a gente num bairro chamado “Terceira” onde encontrávamos com meu avô que estava nos esperando montado em um belo cavalo e ainda trazia mais dois cavalos para irmos até sua residência na roça.
          Assim que descíamos do ônibus, a poeira fazia-se presente e entre abraços e beijos as malas eram colocadas num “Balaio” que estava sobre as costas do cavalo e seguíamos viagem até a roça e eu ficava encantado com a paisagem, o abrir e fechar de porteiras, lindos Ipês de todas as cores e o cavalo andando vagarosamente e às vezes até parando quando encontrava algum pequeno córrego.
           Nossa visita era aguardada por todo o povoado e assim que chegávamos à casa do meu avô os abraços de carinho e saudades eram indescritíveis.
           Entrávamos e lá na cozinha existia um belo fogão à lenha que constantemente ficava aceso para manter o café sempre quentinho e alguns pedaços de lingüiças e torresmos repousavam num varalzinho sob o fogão à lenha.
            Alguns estalos da lenha queimando, mamãe proseando com minha avó e outras vizinhas que vinham nos recepcionar e o barulho do zíper da mala abrindo-se e lá eu ia correndo pegar um velho short para ir jogar bola num campinho que existia ao lado da casa da minha avó.
            E novamente aquele aperto enorme no coração, era hora de voltar para casa e arrumar as malas e então eu pensava:
“Caramba, acho que não deveria existir malas, pois assim não haveria a necessidade de partir!”, mas depois refletia e chegava à conclusão que seria melhor que as mesmas realmente existissem, pois sem elas não seria possível a gente chegar ao nosso destino.
            Até os dezessete anos de idade nossas malas ficaram repousando num canto qualquer da casa e então decidi morar no interior e novamente solicitei a permissão de mamãe para arrumar as malas e morar no interior e ela um pouco triste concordou e enquanto arrumava as minhas malas via um olhar de apreensão no rosto e algumas lágrimas rolavam no rosto de mamãe e o barulho do zíper fechando-se e logo em seguida um abraço muito apertado em mamãe, no papai e nos meus irmãos e eu saindo com duas enormes malas para o meu destino.
         Até hoje quando arrumo as malas para viajar recordo de vários momentos alegres e tristes, Quantas histórias! Quantas malas arrumadas e desarrumadas aconteceram ao longo desses meus cinqüenta e seis anos! 
         Enquanto existir vida e existirem malas meus sonhos ficam repousando num canto da memória e em breve as mesmas serão feitas e poderei esboçar mais um sorriso de Felicidade sob o encantador barulho do zíper fechando-se e eu escutando:
 Pronto já estou feita, podemos partir?