Existia uma
sorveteria perto da casa da minha irmã Sônia, na Vila Maria Alta – SP pertencente
a uma japonesa que fornecia o carrinho e cobrava pelos picolés um preço bem “pequenininho”
e quanto eu não estava empregado com carteira assinada lá estava eu a retirar
alguns sorvetes para vendê-los pelas ruas do bairro.
Era lá numa quarta-feira de verão de
muito calor resolvi retirar uns cem picolés e logo às oito horas
lá estava eu a escolher quais picolés iria vender naquele dia, enchi o carrinho
com quase todos os tipos de sorvetes e saí pelas ruas do bairro vendendo um
aqui outro acolá entre várias buzinadas e quando chegou meio dia percebi que se
eu não andasse mais um pouco não conseguiria vender todos os sorvetes e a
direção foi ir para Vila Maria Baixa e quando cheguei à Praça Eduardo Coathing
estacionei meu carrinho na praça e fiquei pacientemente aguardando os fregueses
naquela tarde muito quente.
Apareceu um garotinho de uns nove anos
e disse que morava na favela e não tinha dinheiro para pagar o sorvete e gostaria
muitíssimo de chupar um picolé de morango, pois estava muito calor.
Olhei bem para o garotinho, com um
chinelinho todo velhinho, uma camisetinha regata com alguns furinhos e uma
surrada bermuda jeans e não tive dúvida, retirei um sorvete de morango e dei ao
garotinho e foi neste exato momento que apareceu uma mulher muito elegante e
disse:
- Eu já
disse pra você não pedir nada pra ninguém e outra coisa, olhe bem para este
sorveteiro, se você não estudar vai ficar igual a ele, vendendo picolés pelas ruas...
Já disse, vamos embora pra casa e devolve este picolé para este insignificante
sorveteiro.
Não me contive, chamei a mulher, olhei bem nos fundos dos seus olhos e
disse:
- Olha aqui
sua FDP mal agradecida, dei o sorvete gratuitamente para o garotinho pensando tratar-se
de apenas mais um pobrezinho, mas pelo visto vemos que não tem nada a ver com a
pobreza e outra coisa se estou a vender picolés pelas ruas é porque ainda não
apareceu uma boa oportunidade de emprego, pois tenho estudo, falo inglês e você
é uma mal agradecida, peguei o carrinho a saí humildemente, empurrando o
carrinho de sorvetes pela praça com os olhos lacrimejados, foi quando se abriu a porta de uma VAN e
apareceu várias pessoas dizendo que pertenciam a equipe de um programa de
televisão e aquilo era apenas uma “PEGADINHA”. Eu estava tão magoado que mandei
todos para o inferno e falei algumas palavras de baixo calão para toda equipe e
saí quase que chorando da praça empurrando meu carrinho com uns trinta sorvetes
que faltavam para serem vendidos.
Quando eu estava preparando-me para
subir o morro para Vila Maria Alta, cansadíssimo apareceu um carro, parou e
disse que gostaria de comprar alguns sorvetes e perguntou-me quantos sorvetes
eu tinha e disse que aproximadamente uns trinta e o senhor comprou todos e
esticou um papel para eu assinar pedindo autorização para publicar a “Pegadinha”
da Praça e ainda receberia uns trocados pela publicação. Assinei os papeis pela
autorização da publicação e pedi um “cachê” três vezes maior ao estipulado e
fui embora para casa com um dinheiro muito bom e fiquei aguardando a minha
aparição na TV, o que não aconteceu, talvez eles tenham pensado duas vezes
antes de publicar o acontecido. Garanto a todos que me senti um pouco
inconfortável com aquele momento e depois quando se lembrava desta “passagem”
ria muito e ficava pensando: Nossa como eu era bobinho com este velho e bondoso coração sempre querendo ajudar o próximo. Mas valeu pela “Pegadinha”. Agora risos, outrora humilhação, mas valeu!