24 de nov. de 2013

MARIA DA CARIDADE

A minha vida andava muito tranquila, afinal eu tinha conseguido um emprego numa padaria como balconista e ganhava o suficiente para manter os meus gastos do cotidiano.
Entre eu atender um freguês e outro ainda existia inspiração para cantarolar alguma canção do querido cantor Roberto Carlos e a cada dia que passava o meu carisma foi esparramado pelos quatro cantos da pacata cidade do interior.
Naquela Sexta-feira entrei na padaria e entre um abraço e outro nas minhas colegas de serviço antes de começar a servir os primeiros fregueses fui chamada pelo dono da padaria para atender um telefonema.
- Alô, é a senhora Maria da Caridade? E eu respondi um pouco apreensiva.
- Sim, sou eu mesmo, em que posso ser útil?
- Olha dona Maria, aqui quem fala é o diretor do abrigo de menores e tenho uma proposta para a senhora em acolher algumas crianças adolescentes que a senhora tanto conhece.
Um pouco espantada eu disse:
- Olha moço, o senhor deve estar enganado, afinal eu não conheço nenhuma criança! E desliguei o telefone e fui lavar as louças que estavam sobre a pia da padaria e enquanto a água da torneira deslizava pelo ralo, o barulho de copos e pratos sendo colocados no escorredor fiquei pensando o que aquele senhor queria comigo e imediatamente fui convocada para atender um novo telefonema e para a minha surpresa do outro lado estava a mesma voz suplicando a minha presença no abrigo.
Desliguei o telefone e pedi para o dono da padaria para ir até o abrigo e assim caminhei até o mesmo e lá chegando fui recebido por uma senhora muito simpática que levou-me até uma sala onde estava o diretor do abrigo.
- Olá dona Maria da Caridade, pode sentar que tenho uma proposta maravilhosa para a senhora.
Um lindo quadro da Santa Ceia estava na parede e enquanto o diretor do abrigo falava dos menores eu ficava imaginando ao lado de todas crianças desamparadas do Mundo e foi quando o diretor pediu para a bondosa senhora do abrigo para ir buscar as duas crianças para eu vê-las e passados alguns minutos dois adolescentes entraram e ficaram na minha frente com as cabecinhas abaixadas e um olhar de abandono.
Levantei-me e fui até os adolescentes e dei um demorado abraço repleto de carinho nos dois e deixei rolar algumas lágrimas pelo meu rosto e aceitei a adoção não só dos dois e disse laconicamente que aceitaria adotá-los se pudesse adotar também os irmãozinhos dos mesmos.
O diretor cofiou a longa barba, abriu alguns papéis e ficou de dar a resposta no dia posterior.
Cheguei na padaria e recomecei o meu trabalho de balconista e enquanto eu estava atendendo um freguês o telefone tocou novamente e eu fui atender e escutei a mesma voz do diretor do abrigo:
- Dona Maria da Caridade, aqui quem fala é o diretor do abrigo e a decisão já está tomada, pode passar aqui no abrigo e levar todas as crianças solicitadas para a sua residência enquanto a senhora aguarda o processo de adoção. Felicidades e muito obrigado por este nobre gesto de caridade.
No dia seguinte lá fui eu até o abrigo no horário marcado pegar as crianças para conduzir até minha residência e dar todo o meu carinho para todos.
A alegria estava no rosto de todos e as crianças que no total eram oito estavam perfiladas e cada qual com uma malinha na mão e quando eu estava colocando todas as crianças numa Kombi para conduzir para minha casa o diretor aproximou-se de mim e disse:
- Dona Maria da Caridade, esta criança é a mais novinha, tem apenas quatro meses e necessita de muita atenção e depositou a pequenininha nos meus braços.
O motor da velha perua roncou, o motorista engatou a primeira marcha e alguns pingos de chuva começaram a cair e eu fiquei olhando para as crianças e deixei novamente meu rosto ser molhado por mais algumas lágrimas de felicidade e foi quando eu escutei:
- Obrigado mamãe! Deus abençoe a senhora!
Chegamos na minha casa e eu fiquei pensando como faria para abrigar tanta criança no exíguo espaço existente na minha propriedade, como faria naquele dia para abrigar a todos, onde dormiriam, como alimentá-las e foi quando escutei a campainha tocar e quando fui atender quase tive um enfarte.
Um enorme caminhão estava parado em frente à minha casa e alguns homens começaram a descarregar beliches, colchões, cobertores, mantimentos e após tudo ser colocado no devido lugar ouvi um Muito Obrigado do motorista do caminhão e ainda recebi um enorme abraço do diretor do abrigo que deixou um número de telefone disponibilizando vinte e quatro horas por dia para qualquer necessidade.
Pedi para minha filha ficar com todas as crianças e entrei silenciosamente no meu quarto, ajoelhei-me diante de Nossa Senhora da Aparecida e fiz uma oração para que me desse muita força, saúde e perseverança em criar aquelas lindas crianças até tornarem-se adultas e pudessem seguir o próprio caminho.

Acabei saindo da padaria para cuidar das crianças em tempo integral e a partir daquele dia a minha vida se transformou em uma alegria inefável e hoje quando estou sozinha fico pensando naquele dia em que fui abraçada por aquelas mãozinhas  e não resisto e deixo rolar algumas lágrimas de Felicidade e fecho os meus olhos e digo tartamudeando: Obrigado Senhor por dar-me tanta força e alegria ao lado dos meus anjinhos!